Anais EnAJUS 2022

ISSN 2674-8401

Desjudicialização da Execução Civil brasileira: Análise do projeto de lei 6.204 de 2019

Autoria: Rafaela Maria Góis Missio, Sandra Negri

Informações

Sessão presencial 17 - 25/10/2022, 16:30
Mediação: Bernardo Oliveira Buta (Fundação Getulio Vargas (FGV-EPPG))

Resumo

A execução brasileira está amoldada em um sistema judiciário congestionado e ineficiente, consequência de uma abertura das portas do Poder Judiciário brasileiro a fim de possibilitar acesso à justiça amplo e igualitário. Aliado a isso, observa-se a falta de consciência da sociedade em resolver conflitos amigavelmente (HILL, 2020. p.8-10) com a necessidade de procurar um terceiro julgador e apaziguador. O fenômeno da desjudicialização, crescente nas últimas décadas, consiste na transferência de procedimentos do Poder Judiciário para lócus diverso, adequado e efetivo, mantendo em seu seio apenas os procedimentos que necessitem de efetiva análise jurisdicional, formulando o acesso à justiça extra muros, fora do Poder Judiciário (HILL, 2020. P.10). Nesse cenário, o projeto de lei 6.204 de 2019 (PL 6204/2019), proposto no Senado Federal brasileiro pela senadora Soraya Thronicke, dispõe sobre a desjudicialização da execução civil de títulos executivos judiciais e extrajudiciais que versam sobre obrigação de pagar quantia certa, líquida e exigível. Esse PL defende que a função de executar esses títulos de crédito seja designada ao Tabelião de Protesto brasileiro. Como justificativa do PL 6204/19, observa-se que a defesa da necessidade de retirar do Poder Judiciário brasileiro a função de executar os títulos executivos judiciais e extrajudiciais de obrigação de pagar pauta-se na quantidade de processos pendentes, no tempo de tramitação até a baixa, além da inefetividade da recuperação de crédito e economia aos cofres públicos. O Tabelião de Protesto pertence à categoria de delegatários de serviços de notas e de registros, conforme art. 236 da Constituição Federal (BRASIL, 1988), aos quais o Estado delega por outorga as serventias extrajudiciais mediante concurso público. Conforme art. 3o da Lei 8935 de 1994, o tabelião e o oficial de registro são profissionais do direito, dotados de fé pública (BRASIL, 1994). O estudo realizado no presente trabalho científico preocupou-se em observar e analisar apenas a proposta de desjudicialização da execução civil fundada nos títulos executivos extrajudiciais, não observando as particularidades da execução dos títulos executivos judiciais. A pesquisa motivou-se a responder a seguinte questão: “Quais os motivos que demonstram a necessidade de desjudicializar à execução civil brasileira e quais as consequências e pontos vulneráveis do PL 6204/19?”. A pesquisa se justifica pela observância da necessidade de manter nas rédeas do Poder Judiciário brasileiro apenas os procedimentos que necessitem de apreciação jurisdicional e transferir os procedimentos de mera execução a um lócus adequado. Como objetivo geral está analisar o tema do projeto de lei 6204 de 2019 proposto no Senado Federal brasileiro e observar possíveis alterações em seu texto e como objetivos específicos elenca-se: explorar o relatório processual “Justiça em Números” (CNJ, 2021); explicitar o procedimento de execução dos títulos executivos extrajudiciais perante o novo agente de execução; analisar pontos de discussão na literatura acerca do PL 6204/19. A metodologia utilizada para a elaboração do primeiro capítulo consistiu em pesquisa qualitativa por meio de revisão bibliográfica de trabalhos científicos pertinentes à desjudicialização da execução civil brasileira e legislações. Realizou-se a análise do projeto de lei brasileiro 6204 de 2019 publicado no site do Senado Federal do Brasil e a análise do Relatório “Justiça em números 2021” publicado pelo Conselho Nacional de Justiça. A respeito do cenário da execução, a partir da análise do relatório processual “Justiça em Números” (CNJ, 2021), observa-se que em relação ao critério quantitativo de número de processos em tramitação e pendentes de baixa, a execução extrajudicial não fiscal representa, em comparação à execução fiscal, quantidade não expressiva. Todavia, o tempo de tramitação da execução extrajudicial não fiscal até a baixa, relacionado a quantidade de processos, aproxima-se a seis anos, e mesmo se fosse retirado do Poder Judiciário a demanda fiscal, o tempo seria de em média três anos. Não foi possível verificar a recuperação de crédito pelo Poder Judiciário, todavia, infere-se que o tempo de tramitação e quantidade de processos pendentes pode influenciar na efetiva recuperação de crédito ou ser consequência da ineficiência dessa recuperação. A proposta de desjudicialização da execução civil não se pauta, de fato, apenas na redução de números, mas além disso, por meio de revisão de literatura, observa-se que a proposta revisita o conceito de acesso à justiça, demonstrando que se deve encontrar lócus adequado a execução de determinado procedimento, a fim de manter no Poder Judiciário os procedimentos que demandem efetiva análise jurisdicional (MISSIO e FÉLIX, 2021. p. 4). Identificou-se, na literatura científica, como vulnerabilidades do projeto de lei 6.204 de 2019: a possível inconstitucionalidade do PL baseada no argumento do princípio da inafastabilidade do acesso ao Poder Judiciário, ou acesso à justiça, ou da jurisdição; a escolha do Tabelião de Protesto como agente de execução; a obrigatoriedade de executar os títulos perante o Tabelionato de Protesto ou a facultatividade do credor executar os títulos no Poder Judiciário ou no Tabelionato de Protesto; a obrigatoriedade de protestar os títulos executivos judiciais e extrajudiciais de obrigação de pagar quantia certa, líquida e exigível antes de iniciar a execução de fato. Identificou-se como pontos de discussão do PL 6204/2019, a partir da revisão de literatura, a possível inconstitucionalidade da proposta legislativa, críticas à proposta do Tabelião de Protesto como agente de execução, a obrigatoriedade da execução perante o Tabelião de Protesto ou a facultatividade de executar os títulos com o novo agente de execução ou no Poder Judiciário brasileiro e a exigência de protesto prévio à execução.

Palavras-chave

Desjudicialização, Extrajudicial, Tabelião de Protesto, Execução.
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