Anais EnAJUS 2023

ISSN 2674-8401

A atuação expandida dos Cejuscs: meio de racionalização e de ampliação do acesso à Justiça

Autoria: Arthur Napoleão Teixeira Filho

Informações

Sessão 18 - 25/10/2023, 08:00
Mediação: Pedro Miguel Alves Correia (Consultor da Direção-Geral da Política de Justiça, Ministério da Justiça de Portugal)

Resumo

 A consensualidade, entendida como a solução consensual ou amigável dos conflitos, está prevista em nosso ordenamento jurídico desde, pelo menos, a Constituição de 1824. Contudo, faltava-lhe maior efetividade. É bem verdade que a Lei dos Juizados de Pequenas Causas (Lei n.° 7.244/1984) e as posteriores Lei dos Juizados Especiais Estaduais e Federais (respectivamente, Leis n.° 9.099/1995 e Lei n.° 10.259/2001) revigoraram a solução consensual de conflitos, mas o fizeram timidamente. Era necessário um novo contexto, um novo Zeitgeist (“Espírito do Tempo”). E ele não tardou a aflorar.Esse panorama passou a ser alterado com a chamada Terceira Onda de Acesso à Justiça, preconizada por Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988) e iniciada nos anos de 1970, com a adoção de outras formas de acesso à Justiça (instrumentalidade do processo), ao lado da gratuitade da Justiça (Primeira Onda) e defesa dos direitos difusos e coletivos (Segunda Onda). Firmado no conceito de Tribunal Multiportas, pelo qual o acesso à Justiça dar-se-ia pelo procedimento mais adequado ante a natureza e o conteúdo do conflito, conviveriam harmoniosamente vias (ou “portas”) como a decisão judicial, a conciliação e a mediação. Com isso, instituía-se um novo paradigma a suplantar a tradicional visão da primazia da solução do conflito pela via adjudicada (decisão judicial). Muito dessa nova visão decorreu do fenômeno mundial da falta de eficácia e efetividade do Poder Judiciário nos mais diversos países e ante a imensa quantidade de processos em tramitação e à crescente complexidade dos temas levados à sua apreciação. Pretendia-se conferir racionalidade à atuação do Sistema de Justiça. Esse movimento em prol da consensualidade foi também experimentado no Brasil, criando-se-se um verdadeiro microssistema. Sua norma germinal foi a Resolução CNJ n.º 125/2010, que instituiu a Política Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Após, seguiram-se, dentre outros, o Código de Processo Civil de 2015, a Lei de Mediação (Lei n.º 13.140/2015) e a Resolução n.° 225/2016 (Justiça Restaurativa). A Resolução CNJ n.° 125/2010 previu a criação dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), que consistem em unidades judiciárias competentes para a aplicação dos métodos adequados de solução de conflitos, com atuação nas áreas processual, pré-processual e da cidadania. Devem ser instalados em locais onde existam, pelo menos, dois juízos, juizados ou varas, com competência para realizar a audiência prevista no art. 334 do CPC (art. 8, § 2.º, da Resolução CNJ n. 125/2010).Portanto, em tese, há uma vinculação do Cejusc a determinada jurisdição relativa à Comarca/Seção ou Subseção Judiciária na qual instalado. A questão que se coloca é: poderia um Cejusc atuar em outros locais, além daqueles abrangidos por sua jurisdição originária? A resposta a essa pergunta se revelou em uma situação prática.Na região que abrange o Sertão Pernambucao estão instaladas as Subseções Judiciárias de Serra Talhada, Salgueiro, Petrolina e Ouricuri. Destas, apenas a Subseção de Petrolina conta com um Cejusc. O magistrado à época titular da Vara Federal em Ouricuri/PE solicitou auxílio ao Coordenador do Cejusc da Subseção Judiciária de Petrolina/PE, de modo que esse Cejusc também atuasse na jurisdição da Subseção de Ouricuri/PE, composta pelos seguintes municípios: Araripina, Bodocó, Exu, Granito, Ipubi, Moreilândia, Ouricuri, Santa Cruz, Santa Filomena e Trindade.Como obstáculos a essa atuação expandida vislumbravam-se a questão da competência dos juízos e a mentalidade contrária às audiências por videoconferência (esse pedido de auxílio ocorreu antes da Pandemia do Covid 19, que normalizou a utilização daquela modalidade de audiência). Após estudo sobre a situação, conclui-se que o Cejusc pode atuar em outras jurisdições diversas da sua originária, vez que sua atuação não está sujeita à aderência a determinado território, e que a audiência por videoconferência não implicaria em cerceamento ao direito de defesa (o que se provou correto no período pandêmico). A bem da verdade, essa atuação expandida do Cejusc para outros juízos buscava justamente ampliar o acesso à Justiça à população atingida, conferindo maior amplitudade à utilização dos métodos consensuais de solução de conflitos. Por garantia, foi solicitada à Corregedoria-Regional do TRF 5.ª Região autorização para o início do projeto. O Corregedor-Regional o autorizou, entretanto, mencionando que tal iniciativa deveria partir do juízes interessados. Com isso, aberta brecha para a replicação do projeto em outras Subseções Judiciárias que não dispunham de Cejusc, carecendo, apenas, de acordo firmado entre os juízes responsáveis. O projeto foi efetivamente implementado, formalizando-se audiências/sessões de conciliação de demandas sujeitas à jurisdição da Subseção Judiciária de Ouricuri/PE. Essas audiências conciliatórias ocorreram por videoconferência e se relacionavam a processos envolvendo questões previdenciárias. A quantidade dessas audiências foi pequena, mas serviu para se aferir a viabilidade da pretendida atuação expandida do Cejusc.E isso ocorreu com êxito posteriormente.Nos anos de 2021/2022 o Cejusc da Subseção Judiciária de Petrolina/PE prestou auxílio ao Cejusc da Justiça Federal em Recife/PE e ao TRF da 5.ª Região, realizando um total de 496 audiências. Em virtude do número reduzido de Conciliadores em Recife/PE, os Juízes Federais Coordenadores dos Cejusc de Petrolina/PE e Recife/PE engendraram esse auxílio, com o beneplácito da Corregedoria-Regional. Note-se que as audiências de conciliação no âmbito do TRF 5.ª Região se deram em processos que estavam em grau de recurso: os acordos obtidos eram homologados pelo Desembargador Relator de cada processo. O presente projeto implicou na ampliação do acesso à Justiça e na adoção dos métodos adequados de solução de conflitos, ao permitir que um Cejusc atuasse em situações além de sua jurisdição original. Há uma inegável economia e uso racional de recursos de toda ordem (financeiro, pessoal, equipamentos etc) e a busca pela maior eficiência do Sistema de Justiça.Trata-se de projeto facilmente replicável em outros Estados, carecendo tão-somente da iniciativa dos juízes interessados.Dentre as lições trazidas pela Pandemia do Covid 19 extraem-se a adoção do Home Office e de reuniões e audiências realizadas por plataformas digitais. Disso ressai a possibilidade de em Estados de maior extensão territorial qualquer Cejusc nele instituído possa prestar auxílio às demais Comarcas/Subseções Judiciárias. Poder-se-ia, ainda, criar-se Cejusc Regionais, com atuação abragendo várias Comarcas/Subseções Judiciárias. Com certeza os resultados deverão ser positivos.O desafio vale a pena! BIBLIOGRAFIA:CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. (1988) Acesso à Justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor. 

Palavras-chave

Cejusc; atuação; expandida;
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