Anais EnAJUS 2023
ISSN 2674-8401
A Judicialização da Saúde e a Mediação como forma Alternativa de Solução de Conflitos: estudo de caso CAMEDS
Autoria: Andressa Silva Bonfim da Costa
Informações
Sessão 10 - 24/10/2023, 08:00
Mediação: Luciano Athayde Chaves (Universidade Federal do Rio Grande do Norte)
Resumo
A presente pesquisa busca examinar a problemática da judicialização da saúde no Brasil, analisando a mediação como uma possível ferramenta de resolução alternativa de conflitos relacionados ao direito à saúde. A investigação consiste em uma abordagem que integra o escrutínio teórico e a pesquisa empírica, tendo como foco um artefato específico - a Câmara de Mediação em Direito à Saúde no município de Imperatriz - MA (CAMEDS). Essa câmara tem como âmbito de atuação a resolução de demandas, tanto individuais quanto coletivas, que envolvem o poder público. O intuito principal é avaliar como este método pode repercutir na judicialização da saúde e no desempenho do judiciário. Esta pesquisa adota uma metodologia que combina revisão bibliográfica, análise quantitativa e estudo de caso. O trabalho inicia com uma análise abrangente do fenômeno da judicialização da saúde, contemplando potenciais causas e implicações. Na sequência, é realizada uma avaliação empírica das demandas processadas pela CAMEDS no período de 2017 a 2020. Esta seção da pesquisa concentra-se na análise do desempenho da CAMEDS, utilizando-se de coleta secundária de dados para determinar o percentual de sucesso das demandas. Entende-se a judicialização como a transferência de decisões de grande impacto político ou social, geralmente tomadas pelo Legislativo ou Executivo, ao Judiciário. Essa transferência implica modificações na forma de apresentação da decisão, na linguagem empregada e na maneira de participação da sociedade (Barroso, 2009). O descompasso entre as políticas públicas na área da saúde e os anseios sociais, acaba por fomentar uma busca por instrumentos eficazes na implementação do acesso a esse direito essencial, que é ligado intrinsecamente à própria natureza humana. A pressão popular sobre os agentes políticos costuma levar certo tempo para que seus efeitos sejam percebidos, notadamente em razão da complexidade normativa e estrutural que envolve a realização de políticas públicas nessa área. Assim, cresce a utilização dos órgãos judiciais como tentativa de acesso imediato e efetivo ao serviço de saúde tido por necessário para um determinado caso (Wang, 2008). O fenômeno da judicialização da saúde, portanto, está ligado ao próprio patamar especial que é conferido aos Direitos Humanos Fundamentais pelo ordenamento jurídico, incluindo aquele estabelecido no plano internacional. Os órgãos judiciais, muitas vezes atrelados tão somente aos textos normativos garantidores dos Direitos Humanos Fundamentais e com uma visão limitada ao caso concreto posto à apreciação, acabam por deferir os pedidos relacionados à prestação na área da saúde sem tentar ampliar o foco de análise. Isso contribui para a desestabilização do sistema organizado para concretizar os serviços de saúde, podendo acarretar mais descompasso entre a atuação estatal e os anseios sociais, gerando um acréscimo da judicialização das questões relativas à saúde. O aumento de demandas judiciais impacta diretamente no serviço de saúde prestado no país. Aborda-se a incapacidade do Brasil de cumprir adequadamente seu compromisso constitucional de prestar o direito à saúde de forma universal, integral e gratuita, fomentando o fenômeno da já nominada judicialização da saúde, impactando também no desempenho do Judiciário. Assim, o que deveria ser o socorro para solucionar questões relacionadas a políticas públicas deficitárias esbarra em outro problema, para além do acesso à Justiça como porta de entrada no sistema, é também necessário ter o direito de obter uma decisão judicial em tempo razoável. O exponencial crescimento de demandas judiciais implica em um congestionamento do Poder Judiciário, resultando em uma tutela jurisdicional deficiente. Para se ter dimensão da problemática, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, no ano de 2021, para cada grupo de 100.000 habitantes, 11.339 ingressaram com uma ação judicial, acréscimo de 9% em relação ao ano de 2020 (CNJ, 2022). Nessa perspectiva, a mediação pode ser definida como um meio de resolução de conflitos de forma não hierarquizada que envolva duas ou mais pessoas, sendo assistidos por um terceiro imparcial, que desempenha a função de mediador (Vasconcelos,2008). A mediação é uma técnica de resolução extrajudicial, mas que também pode ser aplicada quando a demanda já se encontra em curso, que se apresenta como uma alternativa possivelmente mais célere, menos onerosa (para as partes e para o Estado) de composição dos litígios. A mediação pode servir como um recurso para dirimir conflitos em matéria de saúde, habilitando as partes interessadas a construírem soluções de maneira cooperativa. A CAMEDS de Imperatriz, serve como um exemplo tangível da implementação da mediação, tendo exibido resultados promissores em seus estágios iniciais. No entanto, constatou-se uma diminuição progressiva na demanda por seus serviços ao longo do tempo, considerando o lapso temporal de 2017 a 2020. A fim de discernir as causas subjacentes a este declínio, conduziu-se uma investigação, na qual potenciais fatores, como alterações na administração pública municipal e impactos pedagógicos, foram analisados e subsequentemente descartados. Por meio da aplicação de um questionário dirigido aos Defensores Públicos do Estado do Maranhão, atuando especificamente no setor de saúde em Imperatriz, identificou-se a ausência de prazos definidos para a resolução das demandas como um componente adverso. Diante dessa constatação, a pesquisa propõe a implementação de marcos temporais estabelecidos para a resolução desses pleitos. Para uma transformação eficaz na gestão de litígios no setor de saúde, é importante a promoção de uma cultura de não judicialização e a consolidação da capacidade resolutiva do Poder Executivo. Embora a CAMEDS tenha demonstrado eficácia na solução de conflitos, é evidente a necessidade de ajustes para intensificar a procura pelos seus serviços. Além disso, a pesquisa sugere que estudos futuros devem examinar a eficácia de campanhas de sensibilização que visam aumentar a consciência do público em relação ao escopo de atuação da CAMEDS. Isso poderia envolver o entendimento e a disseminação do papel da mediação e da CAMEDS entre os usuários dos serviços de saúde. É igualmente necessário melhorar o treinamento dos agentes públicos que lidam com questões de saúde, a fim de ampliar suas capacidades de resolver eventuais litígios nessa área sem a necessidade de intervenção de terceiros, e, de preferência, sem recurso ao judiciário. Referências: Barroso, L. R. (2009). Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Suffragium - Revista do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará, 5(8), 11-22. https://bibliotecadigital.tse.jus.br/xmlui/handle/bdtse/5498Wang, D. W. L. (2008). Escassez de Recursos, Custos Dos Direitos e Reserva Do Possível Na Jurisprudência Do STF. Revista Direito GV, 4(2). https://doi.org/10.1590/S1808-24322008000200009Conselho Nacional de Justiça. (2022). Relatório Justiça em Números. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/09/justica-em-numeros-2022-1.pdf
Palavras-chave
DIREITO; SAÚDE; JUDICIALIZAÇÃO; MEDIAÇÃO; CAMEDSPDF Todos os trabalhos desta edição