Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

A Pobreza e seus Encontros com a Justiça: Estudo de Caso no Acre

Autoria: Andréa da Silva Brito, Pamera Katrinny Nascimento Silva

Informações

Sessão 25 - 28/11/2024, 09:00
Mediação: Simone de Araujo Goes de Assis (Centro Universitário IESB)

Resumo

 Este relato de experiência baseia-se na atuação de uma profissional de Serviço Social no Tribunal de Justiça do Acre, especificamente na equipe multidisciplinar da Vara de Execução de Penas e Medidas Alternativas (VEPMA) da comarca de Rio Branco, Acre. O caso surgiu por meio de uma Carta Precatória do Estado de Mato Grosso, envolvendo uma pessoa flagranteada sem antecedentes criminais, apresentada em audiência de custódia e residente em Rio Branco. O objetivo é refletir sobre a criminalização da pobreza, a estrutura capitalista punitiva, o surgimento dos substitutivos penais, audiências de custódia, a atuação do assistente social no campo sociojurídico, com foco nas alternativas penais e a oferta de subsídios à magistratura sobre determinantes sociais que incidem sobre a vida do sujeito a serem considerados no encaminhamento da pessoa para a rede de proteção social e na adequação de condições reais de vida. No cerne das expressões da desigualdade social está a problemática do envolvimento de mulheres com o tráfico de drogas e nas relações da economia ilegal da droga entre a polícia e o crime, culminando em espaços públicos dominados pelo crime e pelo medo do crime (Quadrado, 2022). O crescimento da população carcerária no Brasil é um fenômeno preocupante, muitas vezes visto como solução para a violência. No entanto, dados mostram que o aumento da população carcerária não reduz a violência. Segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), em junho de 2014, o Brasil tinha 607.731 pessoas presas, um aumento de 74% nos últimos oito anos (Ministério da Justiça, 2014). Esses dados colocam o Brasil na quarta posição mundial em número de encarceramentos, com 41% dos presos sem condenação. Este relato de experiência aborda a atuação de uma assistente social no contexto das alternativas penais, com base em uma demanda apresentada por meio de Carta Precatória. Utilizando uma abordagem qualitativa descritiva com caráter social, o estudo buscou compreender a realidade específica de um caso e relacionar seus aspectos a um contexto mais amplo. Refletimos sobre a criminalização da pobreza, audiências de custódia e a importância da equipe multiprofissional no âmbito das alternativas penais (Barison, 2007). Este relato trata de uma pessoa presa em flagrante por tráfico de drogas (art. 33, Lei nº 11.343/2006). Durante uma abordagem em um ônibus, foram encontradas cinco porções de cocaína, totalizando aproximadamente 5 kg. A mulher, natural de Rio Branco, Acre, afirmou que levava a droga para Natal, Rio Grande do Norte, em troca de R$ 4.000,00. Apresentada em audiência de custódia em Mato Grosso, a mulher informou que sua família enfrentava dificuldades em Rio Branco. O juízo de Mato Grosso encaminhou Carta Precatória para Rio Branco, solicitando um relatório urgente da equipe multiprofissional sobre a família da pessoa custodiada. A prisão em flagrante foi convertida em preventiva com base nos artigos 312 e 313, I, do Código de Processo Penal. A equipe da VEPMA recebeu a Carta Precatória, e a juíza titular demandou prontamente a equipe técnica. A assistente social fez várias tentativas de contato e visitas domiciliares. Na segunda visita, conseguiu entrevistar a família e coletar dados importantes para o relatório social. A família reside em um ramal periférico de Rio Branco, em uma casa de um cômodo, sem rede telefônica. A água é de poço, e a energia elétrica foi fornecida pelo Programa Luz para Todos. A família enfrenta várias dificuldades, incluindo condições de saúde da filha e do esposo de Maria. A filha tem microcefalia e o esposo tem deficiências físicas decorrentes de um acidente de trânsito, sobrevivendo com benefícios assistenciais. Durante a visita, o esposo relatou que Maria tem três filhos menores (15, 5 e 3 anos), sendo que o mais velho é de um relacionamento anterior. A família vive em extrema vulnerabilidade social, dependendo de dois salários mínimos de benefícios assistenciais. Maria também vivenciou diversos traumas familiares, incluindo expulsão de casa na adolescência, aborto espontâneo e suicídio de um primo. O caso analisado demonstrou a soltura de uma pessoa presa preventivamente em audiência de custódia, com a aplicação de substituição de pena privativa de liberdade por restritivas de direitos após a intervenção realizada. Este relato destaca a complexidade das relações entre cidadãos e o sistema de justiça, frequentemente permeadas por arbitrariedade e vulnerabilidade (Andrade, 2018). Embora a assistente social tenha tido pouco tempo para um aprofundamento maior, a intervenção foi crucial para a soltura de Maria e a substituição de sua pena por restritivas de direitos. As audiências de custódia, a atuação de equipes multiprofissionais e as penas alternativas são fundamentais para humanizar o sistema de justiça e mitigar os efeitos negativos do encarceramento. As penas alternativas devem ser continuamente refletidas e aprimoradas, considerando as práticas realizadas pelo sistema de justiça e seu impacto nos indivíduos criminalizados. O caso analisado resultou na soltura de Maria após a intervenção da equipe multiprofissional, que forneceu um relatório social detalhado ao juízo de Mato Grosso. Isso possibilitou a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, a serem cumpridas em Rio Branco. 

Palavras-chave

Criminalização da pobreza; Multiprofissionais; Alternativas Penais; Interdisciplinariedade
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