Anais EnAJUS 2024
ISSN 2674-8401
Administração judiciária inclusiva: o desenvolvimento de competências socioemocionais como instrumentos necessários para o acolhimento de servidores públicos LGBTI+
Autoria: Diego Paolo Barausse, Aline Gomes dos Santos Silva
Menção honrosa - Categoria Ensaio teórico
Informações
Sessão 07 - 26/11/2024, 14:00
Mediação: Laís Karla da Silva Barreto (Universidade Potiguar)
Resumo
Segundo os dados da justiça, publicados pelo Conselho Nacional de Justiça em 2023, 84 milhões de processos tramitavam no país (Conselho Nacional de Justiça, 2023). Os juízes e as juízas brasileiros, além de lidar com uma alta carga de trabalho, com o cumprimento de diversas metas, precisam desempenhar atividades de gestão administrativa de suas unidades. Portanto, passou a ser indispensável refletir na administração judiciária o desenvolvimento das denominadas competências socioemocionais de questões intrapessoal e interpessoal de suas equipes, tendo em mente as noções organizacionais que envolvem a função jurisdicional. Percebe-se, dessa maneira, que o paradigma da eficiência, além de acarretar modificações na atividade-fim dos magistrados, acabou por trazer consideráveis mudanças nas funções atípicas do Poder Judiciário. O ensaio teórico tem como objetivo refletir a inserção das competências socioemocionais (soft skills) enquanto instrumentos de transformação da gestão de pessoas, em especial de servidores públicos LGBTI+, na administração judiciária. O Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução n. 240/2016, que instituiu a política nacional de gestão de pessoas no Poder Judiciário, conceituando em seu artigo 2°, inciso I, a gestão de pessoas como o conjunto de políticas, métodos e práticas de uma organização voltados a propiciar condições para que os trabalhadores de uma instituição possam desenvolver o seu trabalho, favorecendo o desenvolvimento profissional, a relação interpessoal, a saúde e a cooperação, com vistas ao alcance efetivo dos seus objetivos estratégicos (Conselho Nacional de Justiça, 2016). As soft skills ou as competências socioemocionais exigem autoconhecimento para lidar com a gestão de pessoas e promover a liderança. É preciso ter coragem para olhar para dentro de si (capacidade intrapessoal) e a aptidão para ouvir de maneira empática, compreensiva e acolhedora as demandas de outrem (aprimoramento interpessoal) (Gomes, Segura & Graf, 2022). Tanto a iniciativa privada quanto o funcionalismo público são formados por pessoas e todas elas trazem as suas experiências sociais para o ambiente profissional, inclusive os seus preconceitos e discriminações (Rios, 2008). As pessoas LGBTI+ enfrentam violências no ambiente familiar, algumas são expulsas de casa e abandonam a vida escolar. Uma pequena parcela, quando consegue chegar nas universidades brasileiras, sofre com a invisibilizarão de suas existências (Araújo, 2022). A grande maioria delas têm a identidade de gênero e o nome social negados, baixa empregabilidade formal, raramente ingressam em carreiras públicas e sofrem discriminações para acessar serviços estatais (Pompeu & Souza, 2019). Ainda que vivências heterossexuais sejam significativamente maiores no ambiente profissional, inclusive na esfera pública, com o reconhecimento dos direitos LGBTI+ tornou-se cada vez mais frequente os profissionais declararem abertamente a sua identidade de gênero ou orientação sexual, evidenciando que o ambiente de trabalho é feito por múltiplas pessoas merecedoras de acolhimento e respeito. Os atravessamentos de gênero e de sexualidade não podem ser desprezados nas relações interpessoais do meio profissional. As pessoas, em suas diferentes relações, trocam experiências sentimentais, dialogam, rompem as barreiras do universo corporativo até como forma de construção dos laços profissionais para se atingir metas desenvolvidas nas respectivas unidades. Ora, se o Poder Judiciário reconhece na sua atividade fim os direitos de pessoas LGBTI+, é necessário que o mesmo movimento ocorra no ambiente interno, fazendo com que profissionais diversos e tão competentes quanto pessoas cisgêneras e heterossexuais ingressem em condições de igualdade no funcionalismo público. A diversidade sexual e de gênero, paulatinamente, foi ganhando espaço na esfera organizacional da justiça brasileira. A Resolução n. 240/2016 do CNJ aderiu como princípios da política nacional de gestão de pessoas as práticas em gestão pautadas, entre outros, pela ética, cooperação, eficiência, eficácia, efetividade, isonomia, publicidade, mérito, transparência e respeito à diversidade (Conselho Nacional de Justiça, 2016). Em 2018, o CNJ autorizou que os servidores LGBTI+, em especial pessoas trans e as travestis usuárias dos serviços, magistrados, estagiários, servidores e os trabalhadores terceirizados fizessem uso do nome social em seus registros funcionais, sistemas e documentos do Poder Judiciário (Brasil, 2018). Ainda com foco em gestão, o CNJ tem exercido grande contribuição no sentido de promover as mulheres em condição de especial vulnerabilidade econômico-social no interior da organização judiciária, recomendando aos respectivos Tribunais que reservem percentual de vagas nos contratos de prestação de serviços continuados e terceirizados para mulheres, incluindo as mulheres trans e as travestis, na forma da Resolução n. 497 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça, 2023). O reconhecimento da diversidade e da inclusão é capaz de promover efeitos positivos na vida pessoal dos servidores públicos LGBTI+, que convivem com histórico de preconceito familiar, escolar e social, bem como contribui para um ambiente profissional mais saudável em favor de todos. Tanto as organizações públicas quanto as privadas devem acolher as pessoas que se declaram abertamente gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, travestis, intersexos e outras identidades plurais para se obter os benefícios que essa abertura pode proporcionar ao ambiente de trabalho. Assim, é preciso visibilizar os servidores públicos LGBTI+ na agenda da comunicação organizacional, bem como desenvolver habilidades socioemocionais, consistentes no reconhecimento da diversidade e da inclusão, expandindo a participação de profissionais plurais em mundo administrativo fortemente branco, cisgênero e heterossexual. O ensaio teórico está em consonância com o tema do ENAJUS 2024, uma vez que o desenvolvimento das competências socioemocionais, em especial da inclusão e da diversidade, contribui para que a administração judiciária se torne um ambiente capaz de acolher os seus colaboradores em suas particularidades de gênero e de orientação sexual.Referência BibliográficasAraújo, M. C. dos P. (2022). Pedagogias das Travestilidades. Civilização Brasileira.Conselho Nacional de Justiça. (2016). Resolução n. 240, de 9 de setembro de 2016. Estabelece a Política Nacional de Gestão de Pessoas no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências. Diário da Justiça Eletrônico. https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2342 Conselho Nacional de Justiça. (2023). Resolução n. 497, de 14 de abril de 2023. Dispõe sobre a gestão da identidade digital no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências. Diário da Justiça Eletrônico. https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/5048 Gomes, J. C. de S., Segura, L. G. B., & Graf, P. M. (2022). Habilidades socioemocionais e o magistrado gestor. Revista CNJ, 6(1), 85–94. https://doi.org/10.54829/revistacnj.v6i1.305 Pompeu, S. L. E., & Souza, E. M. de. (2019). A discriminação homofóbica por meio do humor: naturalização e manutenção da heteronormatividade no contexto organizacional. Organizações & Sociedade, 26, 645–664. https://doi.org/10.1590/1984-9260912 Rios, Roger Raupp. Direito da antidiscriminação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008
Palavras-chave
Administração judiciária. Competências socioemocionais. Inclusão e diversidade.PDF Todos os trabalhos desta edição