Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Drogas e Políticas Públicas. Revisitando Alternativas à “Guerra às Drogas”

Autoria: Marcello Popa Di Bernardi, João Mendes da Rocha Neto

Prêmio Tomas de Aquino Guimarães - Categoria Ensaio teórico

Informações

Sessão 25 - 28/11/2024, 09:00
Mediação: Simone de Araujo Goes de Assis (Centro Universitário IESB)

Resumo

 Nas primeiras décadas do século XXI verifica-se de maneira mais concreta no Brasil um intenso debate envolvendo os poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, relacionado à política pública de drogas. “The use of drugs is originally related to the existential vulnerability of the human being, something impossible to be modified” (Sodelli, 2021). O consumo de substâncias psicoativas é parte da história humana, observado desde tempos remotos (Medeiros e Tofolli, 2018). No entanto, ainda que o uso dessas substâncias possa ser visto como inerente ao ser humano, as formas como as sociedades lidam com tal questão diferem ao longo da história. As sociedades sempre tiveram formas de regulamentação social do consumo de drogas, a novidade histórica do século XX foi a introdução do caráter internacional e penal da questão (Gomes-Medeiros et al, 2019). A partir do século XX diversos Estados adotaram políticas públicas relacionadas às drogas caracterizadas por uma abordagem proibicionista que se convencionou chamar de “guerra às drogas”, abordagem estimulada inclusive pela ONU. E no Brasil não foi diferente, pelo contrário, as legislações proibicionistas nacionais foram criadas pari passu às norte-americanas (Fiore, 2012). Ainda que tal abordagem tenha sido preponderante, a realidade mostrou que a “guerra às drogas” não podia ser vencida, o que levou distintos países a repensarem suas políticas públicas de drogas. Tal constatação tem estimulado a revisão de tais políticas públicas historicamente orientadas pelo caráter repressivo e voltadas, basicamente, ao não consumo (Adede e Monteiro, 2014). Surgem, então, novas formas de compreender e intervir no controle, uso e prevenção do uso de drogas, pautado agora não mais na repressão, mas na redução dos danos causados (Adede e Monteiro, 2014). Nesse contexto de novas abordagens destacam-se alguns governos que, afastando-se do então paradigma da “guerra às drogas”, despontam como casos de sucesso ao adotar formas diferentes de lidar com as pessoas que usam drogas Nesse sentido podem ser destacadas as experiencias do Uruguai e Colorado que, valendo-se de políticas públicas disruptivas, passaram a encarar a problemática do uso de drogas por um viés que não encontra precedentes (Gandilhon et al, 2018), bem como da abordagem utilizada por Portugal, tido como exemplo de política pública de drogas inovadora e de sucesso (Moury e Escada, 2023) o que torna o estudo das políticas públicas adotadas nessas diferentes localidades relevantes para outros governos que se propõem a repensar suas políticas de drogas, tais como o Brasil. A partir da análise de um estudo realizado por Moury e Escada (2023) que identificou seis pontos relevantes existentes no modelo português, bem como do estudo feito por (Gandilhon et al, 2018) que realizou uma abordagem comparativa dos dois processos ocorridos no Uruguai e Colorado pretende-se, utilizando o método de estudo de caso, comparar os pontos de sucesso existentes nos modelos adotados nesses países mencionados e as propostas de políticas públicas de drogas atualmente em debate no Brasil. Tal estudo é relevante pois permitirá, ao final, inferir se o caminho que está sendo construído no Brasil relacionado à política de drogas possui os elementos presentes nos modelos estudados e que tornaram tais modelos, inovadores, ou, se o caminho adotado no país se afasta daquele observado nessas três experiências, opção que, em tese, trará maiores incertezas. O tema é atual e se encontra no debate sobre políticas públicas de drogas neste início de século XXI, inclusive com papel de destaque da Suprema Corte brasileira. Eventuais melhorias nessas políticas públicas terão relevante impacto na sociedade e se traduz em inovação jurídico-legal e social. Trata-se de ensaio teórico desenvolvido a partir de uma pesquisa qualitativa e o estudo do caso busca analisar as variáveis e métricas existentes no modelo português de política pública de drogas. Tal opção se deu por esta permitir que um fenômeno contemporâneo seja analisado em seu contexto real de forma ampla e detalhada (Yin, 2018). Em relação ao estudo de caso Godoy (1995) destaca que tem se tornado a estratégia favorita quando o objetivo dos pesquisadores é responder às questões “como” e “porque” determinados fenômenos acontecem, há pouca possibilidade de controle sobre o evento estudado e o foco recai em fenômenos atuais que devem ser analisados dentro de algum contexto de vida real. Quanto aos métodos e técnicas de pesquisa, foi realizada uma pesquisa bibliográfica e hemerográfica sobre descriminalização de entorpecentes no mundo e políticas públicas de drogas. As pesquisas foram feitas na plataforma Scopus, Spell e Google Schoolar e para as buscas foram utilizados como indexadores as palavras “descriminalização”, “políticas públicas de drogas”, “guerra as drogas”, “coalizões de defesa”, “Advocacy Coalition Framework”, “redução de danos”, “Narrative Policy Framework” e em sítios de notícias. Quando possível procurou-se limitar as buscas para artigos científicos revisados por pares e publicados a partir de 2015, mas em razão da baixa produção sobre o tema, tal critério por vezes não foi observado. A análise dos dados foi realizada por meio da técnica de análise de conteúdo, estruturada em três fases: 1) pré-análise; 2) exploração do material, categorização ou codificação; 3) tratamento dos resultados, inferências e interpretação (Bardin, 2011). Os resultados são analisados e a discussão é realizada com apoio da literatura e, ao final, são sugeridas recomendações de melhorias para políticas de drogas no Brasil e uma agenda de pesquisa sobre o tema. ReferênciasAdade, M., & Monteiro, S. (2014). Educação sobre drogas: uma proposta orientada pela redução de danos. Educação e Pesquisa, 40(01), 215-230.Bardin, L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.Fiore, M. (2012). O lugar do Estado na questão das drogas: o paradigma proibicionista e as alternativas. Novos estudos CEBRAP, 9-21.Gandilhon, M., Obradovic, I., Lalam, N., Alimi, D., & Weinberger, D. (2018). Colorado vs Uruguay: deux mode s opposés de légalisation du cannabis [Colorado vs Uruguay: two opposite modes of cannabis legalization]. Drogues, Santé et Société.Godoy, A. S. (1995). Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de empresas, 35, 20-29.Gomes-Medeiros, D., Faria, P. H. D., Campos, G. W. D. S., & Tófoli, L. F. (2019). Política de drogas e Saúde Coletiva: diálogos necessários. Cadernos de Saúde Pública, 35.Medeiros, D., & Tófoli, L. F. (2018). Mitos e evidências na construção das políticas sobre drogas.Moury, C., & Escada, M. (2023). Understanding successful policy innovation: The case of Portuguese drug policy. Addiction, 118(5), 967-978.Sodelli, M. (2021). Hermeneutic Phenomenology of Alcohol Use and Dependence and Other Drugs. Psychology of Substance Abuse: Psychotherapy, Clinical Management and Social Intervention, 119-127.Yin, R. K. (2018). Case study research and applications (Vol. 6). Thousand Oaks, CA: Sage. 

Palavras-chave

guerra às drogas, políticas públicas, alternativas.
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