Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Empoderando Vulneráveis: Atendimento Especializado como Pilar da Coesão Social e Efetividade Institucional

Autoria: Nelson Ricardo de Moraes Nogueira

Informações

Sessão 03 - 26/11/2024, 10:00
Mediação: Tomas de Aquino Guimaraes (Universidade de Brasília)

Resumo

 O acesso à justiça é um alicerce fundamental em qualquer sistema democrático, assegurando que todos os membros da sociedade possam buscar proteção e reparação de direitos. Contudo, grupos historicamente marginalizados, como minorias étnicas, sociais, financeiras, de gênero ou sexualidade, frequentemente encontram barreiras significativas nesse processo. No Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), a implementação de uma política de atendimento humanizado visa corrigir essas desigualdades, colocando as necessidades específicas dos indivíduos no centro das interações judiciárias.A nova abordagem do TJCE foi desenhada para prestar serviços de maneira inclusiva e adaptável, atendendo desde usuários e advogados até servidores e magistrados. Essa mudança não se limitou ao ambiente físico das unidades judiciárias, mas também incluiu o atendimento remoto, pensado para garantir excelência na prestação de serviços a todos os usuários.Grupos como idosos, crianças e adolescentes em situação de risco, pessoas não fluentes no idioma local, mulheres vítimas de violência doméstica, transexuais e travestis, pessoas com deficiência, moradores de rua, analfabetos e semianalfabetos, indivíduos privados de liberdade e egressos do sistema prisional, além de minorias étnico-raciais, anteriormente recebiam um atendimento padronizado que não considerava suas necessidades específicas. Esse modelo genérico frequentemente falhava, criando lacunas na prestação de serviços. Com a implementação dos novos protocolos, as necessidades desses grupos passaram a ser identificadas e quantificadas com precisão, permitindo uma abordagem gerencial mais direcionada e eficaz.Para implementar esses protocolos, foram realizados treinamentos e capacitações, envolvendo 215 servidores e colaboradores do tribunal, focando em habilidades como ouvir, diagnosticar, empatizar, dominar e resolver problemas. Além disso, adaptações físicas e tecnológicas foram feitas em 34 unidades judiciárias e nos sistemas do tribunal para garantir acessibilidade e inclusão.Um Núcleo de Monitoramento do Atendimento foi instituído para garantir que o tribunal operasse de acordo com as novas normas, oferecendo suporte contínuo ao atendimento e aos treinamentos. Esse núcleo não apenas minimiza riscos e assegura que a equipe de linha de frente esteja devidamente capacitada para prestar um serviço de qualidade e humanizado, mas também monitora as ações de implementação da estrutura, infraestrutura, governança, processos e tecnologia necessários para a implementação dos protocolos humanizados e acessíveis de atendimento.A abordagem empática no atendimento tem sido essencial para acelerar os procedimentos legais, beneficiando todos os envolvidos. Quando os profissionais adotam uma postura atenciosa e respeitosa, dentro dos limites legais, conseguem aumentar a eficiência do trâmite das demandas. Essa postura promove um ambiente de confiança e respeito mútuo, crucial para a resolução eficaz dos casos.Outro benefício significativo é o aumento da confiança e satisfação dos membros desses grupos com os serviços judiciários. Isso é alcançado pelo fortalecimento dos canais de acesso para todos os segmentos da população, com maior reforço e preocupação para os segmentos marginalizados. Além disso, diversas parcerias estão em andamento e outras em negociação, visando garantir um atendimento integral à população. Muitas vezes, esse atendimento continua em outras instituições, podemos citar como exemplo o atendimento que envolvem a Secretaria de Proteção Social do Estado do Ceará, a Secretaria Municipal de Finanças do Município de Fortaleza, a Câmara Municipal de Fortaleza, entre outras.A redução das disparidades e desigualdades no sistema de justiça é outro objetivo almejado, promovendo uma sociedade mais justa e inclusiva. Para isso, o TJCE também estabeleceu muitas parcerias colaborativas com organizações da sociedade civil, instituições acadêmicas e outras entidades para identificar e resolver os desafios relacionados à justiça para grupos vulneráveis.Para avaliar o progresso, foram implementados sistemas de monitoramento e avaliação, permitindo ajustes e melhorias contínuas com base em dados e feedback. Pesquisas de satisfação foram realizadas em diferentes pontos da jornada do usuário, tanto no atendimento presencial quanto remoto. Atualmente registramos em nossos canais aproximadamente 1500 pesquisas mensais avaliando o nosso atendimento.A integração de tecnologias inovadoras, como plataformas online e aplicativos móveis, tornou os serviços judiciais mais acessíveis e eficientes para grupos vulneráveis, reduzindo barreiras físicas e geográficas.Desde a implementação dos protocolos, capacitações e mecanismos de acompanhamento, os indicadores de satisfação com o atendimento no TJCE aumentaram significativamente, alcançando um incremento de 97%. Esse aumento foi observado nos diversos canais existentes e nos núcleos de atendimento que foram e estão sendo implantados em todo o Estado.Mas há percalços que apesar dos avanços significativos, a implementação da nova política de atendimento humanizado no TJCE enfrentou. Um dos principais obstáculos foi a mudança da cultura organizacional, onde o atendimento era tradicionalmente visto como uma atividade acessória, e não como uma função principal e essencial do serviço público. Além disso, a linguagem jurídica complexa e elitista, que muitas vezes aliena os usuários, representou uma barreira significativa para a acessibilidade e compreensão. A resistência ao novo também foi um desafio substancial, com muitos profissionais relutantes em adotar as novas práticas e procedimentos. Houve dificuldade em envolver as chefias intermediárias, cuja adesão era crucial para o sucesso da implementação, pois estas chefias frequentemente mantinham uma visão conservadora e estavam acostumadas aos métodos tradicionais. Superar esses desafios exigiu um esforço contínuo de sensibilização, capacitação e a criação de incentivos para fomentar a adesão aos novos protocolos, garantindo que o atendimento humanizado se consolidasse como um pilar central do serviço público judiciário.O empoderamento dos vulneráveis traz benefícios essenciais, como o cumprimento do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16, que promove paz, justiça e instituições eficazes. Ao fortalecer a capacidade de atendimento e acolhimento desses grupos, possibilita-se sua participação ativa no sistema legal e no acesso à justiça, construindo uma sociedade mais justa e equitativa.Investir em atendimento especializado para grupos vulneráveis emerge como uma estratégia eficaz na promoção dos pilares de paz, justiça e instituições eficazes. Análises do primeiro trimestre de 2024 revelaram que 13% do público que acessou os canais de atendimento do TJCE apresentava alguma vulnerabilidade específica. É imperativo continuar investindo no aprimoramento desse atendimento, promovendo a capacitação e garantindo a igualdade de acesso à justiça. Essas medidas são cruciais para a construção de um mundo mais resiliente, compassivo e equitativo, embasado em práticas jurídicas sólidas e evidências científicas.

Palavras-chave

Atendimento a vulneráveis, Humanização, Protocolos de Atendimento
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