Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Enfrentamento da Litigância Predatória e ODS 16: uma Discussão Necessária

Autoria: Mônica Silveira Vieira

Informações

Sessão 13 - 27/11/2024, 08:00
Mediação: Leonardo Ferreira de Oliveira (Centro Universitário IESB)

Resumo

 Enfrentamento da Litigância Predatória e ODS 16: uma Discussão Necessária O ensaio teórico objetiva avaliar a litigância predatória em suas diferentes modalidades (litigância artificialmente criada, litigância fraudulenta e fracionamento desnecessário de pretensões) e seus efeitos negativos em relação ao sistema de justiça em geral e especificamente no que diz respeito ao jurisdicionado e ao acesso legítimo ao sistema de justiça.Com base na releitura do princípio do devido processo legal, à luz de uma versão do Processo Civil voltada para a realização dos direitos materiais - que o compreende como devido processo legal substancial – investiga-se a recalibração do interesse de agir pelo Supremo Tribunal Federal (STF), intérprete máximo da Constituição Federal, e seu impacto sobre a compreensão do direito constitucional de ação, seus contornos e limites. Avalia-se o impacto sobre os poderes-deveres do magistrado, na condução do processo e especialmente na gestão da litigiosidade, da ratio decidendi (que constitui o cerne do precedente) adotada pela maioria dos ministros do STF no julgamento do Tema 1184. Em tal decisão, o tribunal, muito além de formar padrão decisório acerca da racionalização das execuções fiscais municipais, reconheceu que cabe ao Poder Judiciário gerir adequadamente os serviços que presta à população, zelar pela eficiência, pela economicidade e pelo emprego racional dos escassos recursos disponíveis para a prestação jurisdicional, custeados majoritariamente por impostos, o que implica fiscalização rigorosa do interesse de agir. Evidenciou-se, no julgado, a necessidade de avaliar se o custo médio de tramitação processual justifica, em cada caso, a opção pelo acionamento do Judiciário, especialmente se houver alternativas eficazes e menos dispendiosas à disposição do autor. Tal precedente qualificado traz novas questões a serem consideradas no enfrentamento da chamada litigância predatória, conjunto de práticas que, como apontam diversos trabalhos doutrinários, documentos emitidos por Centros de Inteligência do Poder Judiciário (como as Notas Técnicas ns. 1/2022 e 12/2023 do Centro de Inteligência da Justiça de Minas Gerais) e as Diretrizes ns. 7/2023 e 6/2024 da Corregedoria Nacional de Justiça, coloca em risco a funcionalidade do sistema de justiça e a possibilidade de prestação jurisdicional em tempo razoável, além de consumir vultosos recursos públicos. O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 da ONU mais especificamente relacionado à atuação do Poder Judiciário é, sem dúvida, o de número 16, intitulado “Paz, Justiça e Instituições Eficazes”. Seu glossário explicita que envolve “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”. Por sua vez, o item 16.3 de seu desdobramento exige “promover o Estado de Direito, em nível nacional e internacional, e garantir a igualdade de acesso à justiça para todos”. Como a prestação jurisdicional é um serviço escasso rival, serviço público disponível para todos, com capacidade de prestação máxima limitada, do qual os usuários fazem uso mediante emprego de racionalidade econômica de satisfação de seus interesses individuais (quaisquer que sejam eles, resguardados juridicamente ou não), sem considerar a coletividade e sem cuidar da preservação de capacidade de atendimento dos demais jurisdicionados, cabe ao Poder Judiciário – inclusive em cumprimento do padrão decisório estabelecido no Tema 1184 do STF – zelar pelo gerenciamento adequado de tais serviços e pela regularidade do exercício do direito de ação. Os diversos focos de abuso do direito de ação consomem grande parte dos recursos disponíveis para a prestação jurisdicional e resultam em apropriação de porção importante das condições de possibilidade de o sistema de justiça atender àqueles que dele realmente necessitam para buscar a satisfação de seus direitos materiais, especialmente aos mais vulneráveis e aos que buscam no Judiciário o desempenho de seu papel contramajoritário. Mostra-se relevante, pois, determinar de que maneiras e em que medida a litigância predatória afeta o exercício legítimo do direito de ação, e definir estratégias para resguardar tal exercício. A pesquisa é desenvolvida a partir de fontes jurídicas primárias (normas jurídicas constitucionais e legais e precedentes judiciais qualificados, notadamente do Supremo Tribunal Federal, cujo Tema 1184 é utilizado como marco teórico, e do Superior Tribunal de Justiça), de Notas Técnicas dos Centros de Inteligência do Poder Judiciário concernentes à litigância predatória e seu enfrentamento, de determinações do Conselho Nacional de Justiça e da Corregedoria Nacional de Justiça, e também da jurisprudência dos mencionados tribunais e da doutrina jurídica, especialmente nas áreas do Direito Processual Civil e do Direito Civil. Tais fontes são submetidas à análise de conteúdo, em pesquisa de vertente jurídico-dogmática, com investigação da natureza e fundamentos do reconhecimento da litigância predatória, de suas modalidades e das possibilidades juridicamente fundadas de enfrentamento dos focos do abuso do direito de ação. Apresentam-se dados jurimétricos concernentes aos assuntos processuais em relação aos quais se têm identificado focos mais relevantes de abuso do direito de ação e discute-se seu significado, as projeções possíveis e os impactos que demonstram em relação ao exercício do direito de ação e à funcionalidade do sistema de justiça. Ao final, demonstram-se os efeitos negativos que a litigância predatória acarreta em relação ao exercício legítimo do direito de ação e à efetivação do acesso igualitário ao sistema de justiça. Apresentam-se igualmente as estratégias mais eficientes e eficazes de enfrentamento do abuso do direito de ação e aptas a contribuir para o alcance do ODS n. 16 da Agenda 2030 da ONU, fundadas no ordenamento jurídico vigente, com proposta de atuação colaborativa de todos os agentes do sistema de justiça. Referências Bibliográficas Brasil. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 1355208/SC. Relatora: Min. Carmen Lucia, 19 de dezembro de 2023. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?classeNumeroIncidente=%22RE%201355208%22&base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&sort=_score&sortBy=desc&isAdvanced=true . Acesso em: 04 jun. 2024. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Centro de Inteligência da Justiça de Minas Gerais. Nota Técnica n. 1/2022. Litigância predatória. Belo Horizonte, Minas Gerais. DJe 15 jun. 2022. Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Centro de Inteligência da Justiça de Minas Gerais. Nota Técnica n. 12/2023. O Tema Repetitivo 1198 do Superior Tribunal de Justiça. Belo Horizonte, Minas Gerais. DJe 19 fev. 2023.  

Palavras-chave

litigância predatória; abuso; eficiência; custo processual; interesse
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