Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

IA no Judiciário: uma proposta de framework integrativo

Autoria: Stephanie Almeida de Jesus Dias, Renato Máximo Sátiro, Ricardo Limongi

Informações

Sessão 21 - 27/11/2024, 14:00
Mediação: Eloisa Torlig (Observatório de Acesso à Justiça)

Resumo

Apesar da ampla utilização da Inteligência Artificial (IA), mesmo em setores de alta complexidade, como o judiciário, ainda permanecem lacunas que precisam ser discutidas para que os sistemas desenvolvidos possam ser aprimorados e alcançar resultados que supram os anseios destes usuários. Tais lacunas decorrem de diversos fatores, algumas são inerentes a características da própria tecnologia, outras do meio em que estão sendo utilizadas, da atividade que visam realizar ou até mesmo do meio social em que será inserida. Em virtude disto, considerando o contexto da atividade jurisdicional, este estudo sugere um framework que busca agrupar questões em aberto relacionadas à IA. À luz dos desafios e potenciais que a IA apresenta, a necessidade de um framework integrativo emerge como uma possibilidade para orientar o desenvolvimento e aprimoramento das soluções. Este estudo propõe um modelo, focado em identificar as questões em aberto, fomentar análises críticas e sistematizar as dimensões e desafios relacionados a esta tecnologia. A proposta deste framework não visa estimular a adoção da tecnologia para otimizar a prestação jurisdicional, mas sim dar foco a questões a serem discutidas para que a modernização do sistema judiciário explore o potencial da IA com confiança e responsabilidade, ao mesmo tempo, em que mitigam os riscos associados à sua aplicação.Para identificar o estado da arte sobre IA e as dificuldades e vieses decorrentes da utilização desta tecnologia no âmbito do Poder Judiciário foi realizada uma busca utilizando bases bibliográficas (e.g., Scopus, Web of Science, Science Direct e EMBASE). O fluxo de atividades amparou-se na sequência sugerida pelo método PRISMA (Moher et al., 2009) ?com o intuito de conferir maior transparência e reprodutibilidade, assim, as etapas consistiram em identificação, seleção, elegibilidade e inclusão. Como resultado deste processo, nesta revisão da literatura foram avaliados 66 artigos que apresentavam maior aderência ao tema. A leitura completa desses artigos resultou na identificação de 38 categorias que representam desafios a serem superados para o adequado desenvolvimento e implementação dessa tecnologia no sistema judicial. A natureza dessas categorias é heterogênea, incluindo limitações decorrentes da falta de informações suficientes para o treinamento dos modelos (Simkova & Smutny, 2021), da ambiguidade, não somente fruto da polissemia, mas também de construções imprecisas das ideias (Ji, 2020; Xu, 2022), do conflito de interesses entre as empresas que desenvolvem os sistemas e aqueles impactados (Ulenaers, 2020), até a distância existente entre as áreas de tecnologia e direito, que explica a baixa capacitação dos operadores do direito acerca dessa tecnologia e desenvolvedores acerca da lei (Xu, 2022). A análise dos tópicos revelou que tais questões surgem em decorrência de fatores, alguns inerentes a atributos das técnicas de IA, da atividade que visam realizar ou até mesmo do tecido social no qual serão integradas. Assim, não basta que os especialistas em tecnologia aprimorem técnicas e algoritmos ou que a sociedade esteja preparada e disposta a recepcionar estes sistemas, pois ainda restariam outros desafios em decorrência de características próprias do Estado de Direito e da função jurisdicional. Isso evidencia a multidisciplinaridade do tema, apontando para a necessidade de uma abordagem holística, que englobe ações, pesquisas e diálogos nas dimensões sociais, tecnológicas, gerenciais e jurídicas. Considerando a relevância da criação de pontes entre as áreas do saber é imperativo avançar conjuntamente em várias frentes e perspectivas. A fim de contribuir com algumas dessas perspectivas a discussão das 38 categorias identificadas inicialmente foram agrupadas em duas áreas de análise, internas e externas ao Poder Judiciário e dividida em quatro dimensões: (1) características da tecnologia; (2) sociedade; (3) direito; e (4) ato de julgar. Essa estrutura visa facilitar a compreensão e o tratamento das questões identificadas, contribuindo para o avanço na aplicação da IA no contexto judicial. Os resultados desta pesquisa apontam, em especial, para a necessidade de uma colaboração estreita entre os campos da administração da justiça, tecnologia e direito, a fim de superar os desafios identificados. A análise revela que apesar do esforço já dedicado a esse tema e dos progressos já alcançados, ainda há um vasto campo de pesquisa e desenvolvimento a ser explorado. Ainda são necessários avanços que possibilitem, por exemplo, a promoção da alfabetização digital no contexto judicial, desenvolvimento de sistemas que compreendam e atuem alinhados aos princípios fundamentais do direito, que considerem especificidades do Estado de Direito, adaptáveis às mudanças legislativas e às lacunas legais. Por fim, este estudo permite inferir que o processo de inclusão de soluções de IA no contexto judicial apresenta desafios que emergem conforme a tecnologia e as possibilidades de implementação avançam. Desse modo, é essencial a criação de um ecossistema administrativo, legal e tecnológico que seja tanto inovador quanto inclusivo, com equilíbrio entre as possibilidades que a tecnologia oferece e o respeito aos princípios que fundamentam a justiça e o direito.  Referências Ji, W. (2020). The Change of Judicial Power in China in the Era of Artificial Intelligence. Asian Journal of Law and Society, 7(3), 515–530. https://doi.org/10.1017/als.2020.37Moher, D., Liberati, A., Tetzlaff, J., & Altman, D. G. (2009). Guidelines and Guidance Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses: The PRISMA Statement. PLoS Medicine, 6(7). https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1000097Simkova, N., & Smutny, Z. (2021). Business E-NeGotiAtion: A method using a genetic algorithm for online dispute resolution in B2B relationships. Journal of Theoretical and Applied Electronic Commerce Research, 16(5), 1186–1216.Ulenaers, J. (2020). The impact of artificial intelligence on the right to a fair trial: Towards a robot judge? Asian Journal of Law and Economics, 11(2). Xu, Z. (2022). Human Judges in the era of artificial intelligence: Challenges and opportunities. Applied Artificial Intelligence, 36(1), 2013652.

Palavras-chave

Judiciário; Inteligência Artificial; Revisão da Literatura
PDF Todos os trabalhos desta edição