Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

O Atendimento à Pessoa Custodiada para Superação do Estado de Coisas Inconstitucional

Autoria: Andréa da Silva Brito, Aline Gomes dos Santos Silva

Informações

Sessão 14 - 27/11/2024, 08:00
Mediação: Adalmir de Oliveira Gomes (Universidade de Brasília)

Resumo

 O texto tem como objetivo analisar a contribuição do Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada (APEC) nas audiências de custódia no contexto da superação do estado de coisas inconstitucional do sistema prisional brasileiro. A hipótese central é que o APEC, ao atender pessoas vulneráveis e racialmente perfiladas, atua na redução da superlotação carcerária e promove o aumento da proteção social dessas pessoas (Brasil, 2024). O estudo analisa a implementação do APEC na Comarca de Rio Branco, Acre, um estado que, em 2021, registrava a maior taxa de aprisionamento do país (Secretaria Nacional de Políticas Penais, 2024). O estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro foi reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 347/DF. Essa ação judicial destacou a necessidade urgente de reformulação das políticas públicas para assegurar os direitos fundamentais dos presos, frequentemente violados devido à superlotação e condições precárias nas prisões. Em resposta, o STF determinou a realização de audiências de custódia em até 24 horas após a prisão, como forma de prevenir abusos e garantir direitos (Brasil, 2015). A metodologia empregada neste estudo é a bibliográfica, com base em pesquisas acadêmicas e dados empíricos de órgãos oficiais. O trabalho diferencia-se por não se limitar a uma abordagem teórica, mas por analisar a realidade prática da implementação do APEC na Comarca de Rio Branco, conforme dados do SISTAC (Conselho Nacional de Justiça, 2024). A população carcerária no Brasil aumentou dramaticamente de 232.755 pessoas, em 2000, para 644.316, em 2023, um crescimento de 176,82%, segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública (2024). Este aumento não refletiu em uma redução da violência, conforme indicado pelo Relatório Global Peace Index 2023, que posicionou o Brasil na 132ª posição, uma queda significativa desde 2018, quando ocupava a 106ª posição (Institute for Economics & Peace, 2023). O perfil demográfico da população carcerária brasileira é predominantemente jovem (55% até 29 anos) e negra (68,2%, em 2022). As condições precárias de encarceramento comprometem a ressocialização e perpetuam a criminalização da pobreza e do racismo. O STF, ao reconhecer o estado de coisas inconstitucional na ADPF 347, determinou a implementação de audiências de custódia para mitigar violações de direitos fundamentais. Este reconhecimento implica uma admissão de inconstitucionalidade por omissão, destacando a necessidade de ações estruturais para garantir os direitos dos presos. As audiências de custódia, regulamentadas pela Resolução nº 213/2015, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), têm sido fundamentais para reduzir a superlotação carcerária. Desde 2015, mais de 1,1 milhão de audiências foram realizadas, contribuindo para uma redução de 14% na taxa de presos provisórios. O APEC, por sua vez, atua na identificação e encaminhamento de pessoas em situação de vulnerabilidade para políticas de proteção social (Conselho Nacional de Justiça, 2020). Dados do Sistema de Audiências de Custódia (SISTAC) indicam que, após a implementação do APEC em Rio Branco, houve um aumento significativo no encaminhamento para serviços de proteção social e na investigação de tortura. Entre janeiro de 2022 e maio de 2024, foram realizadas 2.930 audiências de custódia, com 36% dos casos resultando em encaminhamentos para proteção social. A implementação do APEC em Rio Branco demonstrou um aumento na proteção social e redução do encarceramento excessivo. A análise dos dados revela uma atuação mais humanizada e eficiente na porta de entrada do sistema penal, contribuindo para a mitigação do racismo e criminalização da pobreza (De Vitto; Daufemback, 2018). A decisão do STF na ADPF 347 e a subsequente implementação de políticas como o APEC são passos importantes para enfrentar o estado de coisas inconstitucional e promover uma justiça mais equitativa. O estudo conclui que o Serviço de Atendimento à Pessoa Custodiada, ao atuar nas audiências de custódia, desempenha um papel crucial na redução da superlotação carcerária e na promoção da justiça social. A humanização do processo penal, por meio de audiências de custódia e do APEC, representa um avanço significativo na proteção dos direitos fundamentais e na redução das desigualdades raciais e sociais no sistema prisional brasileiro. REFERÊNCIAS Brasil. Conselho Nacional de Justiça. (2015). Resolução nº 213, de 15 de dezembro de 2015. Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas. Brasília, DF: CNJ. Recuperado de https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2234 Brasil. Conselho Nacional de Justiça. (2020). Manual de proteção social na audiência de custódia: parâmetros para o serviço de atendimento à pessoa custodiada. Brasília, DF: CNJ. Recuperado de https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/11/manual_de_protecao_social-web.pdf Brasil. Conselho Nacional de Justiça. (2024). Caderno temático de relações raciais: diretrizes gerais para atuação dos serviços penais. Brasília, DF: CNJ. Recuperado de https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2024/05/caderno-relacoes-raciais.pdf Brasil. Conselho Nacional de Justiça. (2024). Estatísticas sobre Audiências de Custódia Nacional. Atualizado em 03/06/2024. Recuperado de https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=be50c488-e480-40ef-af6a-46a7a89074bd&sheet=ed897a66-bae0-4183-bf52-571e7de97ac1&lang=pt-BR&opt=ctxmenu,currsel Brasil. Ministério da Justiça e Segurança Pública. (2014). Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Infopen – Junho 2014. Brasília, DF: Departamento Penitenciário Nacional. Recuperado de https://www.justica.gov.br/news/ha-726-712-pessoas-presas-no-brasil Brasil. Supremo Tribunal Federal. (2015). Acórdão de julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347. Brasília, DF. Recuperado de https://bit.ly/2NGyVPo Conselho Nacional de Justiça. (2024). Sistema de Audiência de Custódia (Sistac). Audiência de Custódia. Recuperado de https://www.cnj.jus.br/ sistema-carcerario/audiencia-de-custodia/sistac/ De Vitto, R.; & Daufemback, V. (2018). Para além das prisões: reflexões e propostas para uma nova política penal no Brasil. Belo Horizonte: Letramento. Institute for Economics & Peace. (2023). Global Peace Index 2023: Measuring Peace in a Complex World. Sydney: Institute for Economics & Peace. Recuperado de http://visionofhumanity.org/resources Secretaria Nacional de Políticas Penais. (2024). Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (SISDEPEN). Levantamento nacional de informações penitenciárias. Recuperado de https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiM2U1MmYyY2QtNjE2Yy00ZmU2LWFiMzItMGU5ZTBhODgzMTQzIiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9 Supremo Tribunal Federal. (2024). Ação Declaratória de Preceito Fundamental nº 347 MC, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 04/10/2023. Brasília, DF: STF. 

Palavras-chave

Sistema Prisional, Racismo, Proteção Social.
PDF Todos os trabalhos desta edição