Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Reflexos Curriculares da Política de Consensualização de Conflitos e as Competências do Profissional da Autocomposição

Autoria: Marilia Vieira Xavier de Oliveira, Ramon Rebouças Nolasco de Oliveira, Erik Dênio Gomes de Oliveira Filho

Informações

Sessão 23 - 27/11/2024, 14:00
Mediação: Eda Castro Lucas de Souza (Centro Universitário IESB)

Resumo

INTRODUÇÃO A política brasileira de consensualização de conflitos tem provocado mudanças no sistema de justiça. Os métodos de tratamento de conflitos baseavam-se na heterocomposição, com um terceiro imparcial impondo uma solução. Esse modelo adversarial frequentemente resulta em decisões que não atendem plenamente aos interesses dos envolvidos, provocando prolongamentos das demandas e insatisfações dos sujeitos.O objetivo geral é compreender a influência, na estrutura curricular dos cursos de Direito, exercida pelas políticas de consensualização de conflitos, a partir das competências identificadas como necessárias para a formação dos profissionais autocompositores.A justificativa da pesquisa se relaciona com a busca pelo aperfeiçoamento das instituições que formam os profissionais do Direito. A metodologia adotada envolve revisão bibliográfica e documental. 2 ACESSO À JUSTIÇA E MÉTODOS CONSENSUAIS NOS CURSOS DE DIREITO Os conflitos são inevitáveis nas relações sociais, resultantes das divergências que perpassam diversos aspectos relacionais (Vasconcelos, 2008). A administração dos conflitos pode envolver a autotutela, em que as partes resolvem diretamente suas disputas. Na heterocomposição, há a intervenção de terceiros que impõem a decisão. Com a consolidação de sistemas jurídicos modernos, passou-se a privilegiar a heterocomposição, com a figura do juiz ou árbitro (Cintra; Grinover; Dinamarco, 2005).O sistema judiciário enfrenta o desafio de atender à litigiosidade, num contexto de morosidade processual alardeada. Os métodos autocompositivos permitem oferecer um tratamento mais humano e participativo. Frequentemente, são propostos também com intuito de acelerar os julgamentos e reduzir a sobrecarga processual (Takahashi, 2022).Porém, não se deve pensar na autocomposição somente como desafogamento do Judiciário, mas na qualidade do acesso à justiça, o que implica na mudança cultural dos juristas e da sociedade. Vários movimentos institucionais têm adotado políticas de consensualização de conflitos. O MEC, ao instituir as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para os cursos de graduação em Direito, por meio da Resolução CNE/CES/MEC nº 5/2018, estabeleceu que o perfil do graduando contemplasse “o domínio das formas consensuais de composição de conflitos” (art. 3º, caput). A partir disso, se tornou comum os cursos abordarem disciplinas envolvendo Mediação, Conciliação e Arbitragem.É necessário desenvolver competências específicas, como a habilidade de mediar diálogos, compreender os aspectos emocionais e relacionais dos conflitos, promovendo a cooperação entre as partes. Essas competências vão além do conhecimento técnico, envolvendo um conjunto de habilidades, conhecimentos e valores, num saber-agir complexo (Oliveira, 2019). A formação curricular dos graduandos deve “desenvolver a cultura do diálogo e o uso de meios consensuais de solução de conflitos” (Brasil, 2018), sendo esta umas das competências previstas nas citadas DCN. 3 COMPETÊNCIAS NECESSÁRIAS PARA O PROFISSIONAL DA AUTOCOMPOSIÇÃO O projeto Alfa Tuning América Latina (Felix, 2014) desenvolveu um metaperfil do profissional do Direito, delimitando competências mínimas do profissional do Direito. Entre elas, foram selecionadas aquelas mais relacionadas às práticas de autocomposição para definição do que seria adequado ao perfil do autocompositor. O desenvolvimento de um comportamento ético e sensível às pessoas e às instituições, promovendo a comunicação adequada em diferentes contextos é a base para qualquer profissional da autocomposição. Jean François Six (2001) destaca que o ato ético do mediador deve ser realizado com coragem, prudência e justeza.A capacidade de trabalhar em ambientes coletivos e diversos é outra competência fundamental. Costa (2004) afirma que as diferenças entre as pessoas são a base para a autonomia individual, sendo o trabalho em equipe um ambiente para a realização dessa autonomia.A competência de aplicar conhecimento teórico a problemas reais, integrando saberes interdisciplinares, também é basilar. Perrenoud (1998) ressalta que uma abordagem baseada em competências deve enfrentar problemas reais.A investigação e interpretação de conceitos jurídicos fundamentais, contextualizando-os com experiências locais e globais, também são necessárias. Almeida, Souza e Camargo (2013) enfatizam a necessidade de aproximar o ensino do Direito da realidade social, integrando os alunos com a comunidade.Finalmente, a capacidade de integrar imaginação e criatividade na aplicação de técnicas e procedimentos é essencial. Desenvolver essas competências de forma transversal e integrada às políticas de consensualização de conflitos é essencial para o preparo do profissional autocompositor. CONCLUSÃO As mudanças nas políticas curriculares e a formação de competências específicas para os profissionais da autocomposição são passos fundamentais para a implementação efetiva dessa política. A inclusão dos métodos autocompositivos no sistema de justiça contribui para atender aos reais interesses dos envolvidos.A adoção de práticas autocompositivas, no entanto, requer um compromisso de todos os envolvidos no sistema de justiça e na educação jurídica. Os cursos devem continuar aprimorando-se, incorporando novos métodos e técnicas, promovendo uma aprendizagem significativa. Os profissionais já atuantes no sistema de justiça devem ser incentivados a participar de programas de capacitação contínua, garantindo que estejam atuando em consonância com as competências mínimas esperadas de um profissional autocompositor. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Frederico de; SOUZA, André Lucas Delgado; CAMARGO, Sarah Bria de. Direito e realidade: desafios para o ensino jurídico. In: GHIRARDI, José Garcez; FEFERBAUM, Marina (Orgs.). Ensino do direito em debate: reflexões a partir do 1° Seminário Ensino Jurídico e Formação Docente. São Paulo: Direito GV, 2013. BRASIL. Resolução nº 5, de 17 de dezembro de 2018. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras providências. Diário Oficial da União, seção 1, Brasília, DF, Seção 1, p. 122, 18 dez. 2018.  CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2005. COSTA, Alexandre Araújo. Cartografia dos Métodos de Composição de conflitos. In: AZEVEDO, André Gomma de. Estudos em Arbitragem, Mediação e Negociação. Vol 3 / André Gomma de Azevedo (org.) – Brasília: Grupos de Pesquisa, 2004. FELIX, Loussia Penha Musse. (ed.) Ensino Superior na América Latina: reflexões e perspectivas sobre Direito. Projeto Tuning América Latina. Bilbao: Universidad de Deusto, 2014. Disponível em: http://tuningacademy.org/wp-content/uploads/2014/09/A-Latina-2013-Derecho-PORT.pdf. Acesso em: 27 ago. 2022. FISHER, Roger; URY, William; PATTON, Bruce. Como chegar ao sim: negociação de acordos sem concessões. 2ª ed. rev. ampliada. Rio de Janeiro: Imago Ed., 2005. OLIVEIRA, Ramon Rebouças Nolasco de. Educação jurídica em contextos de inovação pedagógica e sociocultural: a experiência brasileira nas perspectivas docente e discente da FD-UnB e UFERSA. 2019. 509 f., il. Tese (Doutorado em Direito) - Universidade de Brasília, Brasília, 2019. Disponível em: https://repositorio.unb.br/handle/10482/37672. Acesso em: 27 ago. 2022. PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: Artmed, 1999. SIX, Jean François. Dinâmica da Mediação. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.  TAKAHASHI, Bruno. Galanter e a Litigiosidade: Uma Reapresentação. In: YARSHELL, Flávio Luiz et al. Acesso à justiça, direito e sociedade: estudos em homenagem ao professor Marc Galanter. 2022. VASCONCELOS, Carlos Eduardo de. Mediação de conflitos e práticas restaurativas. São Paulo: Método, 2008.

Palavras-chave

Consensualização de Conflitos, Currículo de Direito, Competências Profissionais.
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