Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Trabalho Emocional no Poder Judiciário Brasileiro: Diagnóstico e Possibilidades de Intervenção

Autoria: Larissa Cunha Dantas, Cynara Carvalho de Abreu

Informações

Sessão 11 - 26/11/2024, 16:00
Mediação: Fernanda Alves Andrade Guarido (IBEPES – Instituto Brasileiro de Estudos e Pesquisas Sociais)

Resumo

Título: Trabalho emocional no Poder Judiciário brasileiro: diagnóstico e possibilidades de intervenção em um tribunal federal Palavras-chave: Trabalho emocional; Psicologia do trabalho; Psicologia organizacional; Poder Judiciário brasileiro; Tribunal federal. CORPO: O trabalho emocional é compreendido como o esforço dos trabalhadores para expressar emoções adequadas no ambiente laboral, de modo a atender às demandas de conduta e comportamento da atividade profissional. Compreende o ciclo de processos neurofisiológicos, cognitivos e comportamentais, conscientes ou não, automáticos ou controlados, que têm a finalidade de mudar a experiência emocional por meio da modificação da expressão das emoções ou do que se sente em diferentes contextos (Gross, 2013). A literatura científica acolhe as emoções como indissociáveis da cognição humana, percebendo os processos emocionais e cognitivos como interdependentes e fortemente relacionados, especialmente na tomada de decisões. Os afetos e emoções assumiram papel relevante na gestão organizacional, como propulsores das rotinas de trabalho (Fineman, 2001), o que gerou a necessidade de aprofundamento nos estudos interdisciplinares sobre o tema.Com o objetivo de propor intervenções para enfrentamento dos aspectos nocivos do trabalho emocional no Judiciário brasileiro, foi desenvolvida pesquisa que teve início com um diagnóstico organizacional do trabalho emocional no Tribunal Regional do Trabalho da 21ª Região (TRT21). Em seguida, investigou-se a correlação dos resultados do diagnóstico com variáveis pessoais e organizacionais que, por hipótese, impactam o bem-estar dos trabalhadores do Poder Judiciário brasileiro. A partir desses resultados, foram propostas intervenções possíveis para a promoção do bem-estar emocional de magistrados e servidores em um tribunal do Poder Judiciário.Na primeira etapa, através da aplicação a servidores e magistrados de questionário eletrônico desenvolvido a partir da versão brasileira da Emotional Labour Scale (Brotheridge & Lee, 2003), a Escala de Trabalho Emocional (ETE-Br) (Silva & Gondim, 2019). Os dados coletados confirmaram a presença do construto trabalho emocional no TRT21, em suas três facetas - demandas emocionais de trabalho (DET) e estratégias de regulação emocional, nas dimensões de ação superficial (EAS) e ação profunda (EAP). Ao investigar a correlação dos dados coletados pelo questionário com variáveis pessoais e organizacionais como gênero, tempo de serviço e regime de trabalho, constatou-se trabalho emocional mais intenso nos servidores da área judiciária, que trabalham com atendimento ao público e em contato direto com autoridades.Os dados coletados confirmaram que o retorno ao trabalho presencial após a pandemia de COVID-19 impactou negativamente o bem-estar de magistrados e servidores, em conformidade com o Diagnóstico sobre a saúde mental de magistrados e servidores no contexto da pandemia de COVID-19 (CNJ, 2022), que evidenciou cenário de piora no estado de saúde de modo geral, humor e cansaço entre julho de 2020 e dezembro de 2021. Esse resultado converge com as mudanças globais no mercado de trabalho neste período pós-pandêmico. O trabalho deixou de ser o centro da vida, e os trabalhadores buscam regimes de trabalho alternativos que permitam maior flexibilidade, autonomia e liberdade. Ao ordenar o retorno ao regime tradicional de trabalho presencial, o Poder Judiciário brasileiro impôs estresse emocional a servidores e magistrados, o que repercutiu diretamente nos indicadores de saúde e bem-estar aferidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Essa conclusão está evidenciada nas pesquisas nacionais que apontam piora na saúde física, mental e emocional de servidores e magistrados após o retorno das atividades presenciais após a pandemia de COVID-19.Para abordar a problemática evidenciada, sugerem-se intervenções administrativas no âmbito da saúde, gestão e capacitação de pessoas: capacitação de magistrados, servidores e gestores com ênfase no desenvolvimento socioemocional das pessoas; a promoção de maior aproximação entre servidores e magistrados; a adoção de abordagem ativa nos casos de transtornos mentais e comportamentais (grupo F da CID-10); e a necessidade de atuação assertiva do setor de gestão de pessoas em aspectos organizacionais como inadequação da lotação e desequilíbrio na distribuição qualitativa e quantitativa da força de trabalho. Porém, as intervenções propostas apenas amenizam o atual contexto de estresse emocional dos servidores do Judiciário, não sendo eficazes para a solução definitiva dos problemas identificados, sendo necessárias mudanças na cultura organizacional.No Poder Judiciário brasileiro, ainda prevalece uma cultura organizacional rigidamente hierarquizada que impõe óbice aos anseios dos servidores por melhorias no contexto do trabalho e da sua relação com a saúde emocional, mental e física das pessoas. Como já destacava Dallari (2002), o Judiciário brasileiro tende a perpetuar inadequações incorporadas como tradições intocáveis, dentre elas o autoritarismo, a distinção de tratamento e distanciamento entre magistrados e servidores, além do exercício, pelos magistrados, da administração de suas equipes de trabalho sem a necessária capacitação em gestão de pessoas. As respostas abertas coletadas na pesquisa revelam aspectos culturais que devem ser encarados e repensados, para o bem dos órgãos do Judiciário brasileiro e das pessoas que os compõem.Ao trilhar esse caminho, o Poder Judiciário brasileiro, pioneiro na institucionalização da Agenda 2030 e na indexação de mais de 80 milhões de processos com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, promoverá o bem-estar de servidores e magistrados, cumprindo o ODS 3 (Saúde e bem-estar: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades), o ODS 8 (Trabalho decente e crescimento econômico: promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo, e trabalho decente para todos) e o ODS 16 (Paz, justiça e instituições eficazes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis).  Referências: Brotheridge, C. M. & Lee, R. T. (2003). Development and validation of the emotional labour scale. Journal of occupational and Organizational Psychology, 76(3), 365-379. Conselho Nacional de Justiça (2022). Diagnóstico sobre a saúde mental de magistrados e servidores no contexto da pandemia de COVID-19. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/11/pesquisa-saude-mental-2022-v2-24052022-1.pdf.  Conselho Nacional de Justiça (2022). Painel analítico do diagnóstico sobre a saúde mental de magistrados e servidores no contexto da pandemia de Covid-19. https://paineisanalytics.cnj.jus.br/single/?appid=a751de10-a812-4479-b076-4de13949d7c2&sheet=be8b7511-b562-4fb9-897e-f66297d6d96a&lang=pt-BR&opt=ctxmenu,currsel.  Conselho Nacional de Justiça (n.d.). Painel analítico sobre saúde dos magistrados e servidores do Poder Judiciário. https://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/saude-dos-magistrados-e-servidores/. Dallari Abreu, D. (2002). O despertar dos juízes. Prisma Jurídico, (1), 67-74. Fineman, S. (2001). Emotions and organizational control. Emotions at work: Theory, research and applications in management, 219-237. Gross, J. J. (2013). Emotion regulation: taking stock and moving forward. Emotion, 13(3), 359. Organização das Nações Unidas (n.d.). Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. https://brasil.un.org/pt-br/sdgs.Silva, L. B. & Gondim, S. M. G. (2019). Escala de trabalho emocional: adaptação e evidências de validade. Estudos de Psicologia (Campinas), 36, e170065. 

Palavras-chave

Trabalho emocional; Psicologia do trabalho; Psicologia organizacional; Poder Judiciário brasileiro; Tribunal federal.
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