Anais EnAJUS 2024

ISSN 2674-8401

Fortalecimento e empoderamento de tribunais nacionais: a influência de soluções amistosas entre Estado e atores não estatais na CIDH

Autoria: Ana Carolina Campara Verdum, Ademar Pozzatti

Menção honrosa - Categoria Trabalho empírico

Informações

Sessão 26 - 28/11/2024, 09:00
Mediação: Fabricio Castagna Lunardi (Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios)

Resumo

 Indivíduos e organizações não governamentais (ONGs) – desde que reconhecidas em, ao menos, um Estado parte da Organização dos Estados Americanos (OEA) – podem apresentar perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) petições com denúncias ou queixas de violação da Convenção Americana de Direitos Humanos (1969) e outros documentos internacionais, perpetrada por um Estado membro da OEA. Durante a tramitação desse processo, as partes envolvidas podem concordar em instaurar uma solução amistosa, que se trata de um procedimento autocompostivo supervisionado pela CIDH. Quando exitosa a solução amistosa, as partes assinam um acordo contendo medidas reparatórias a que o Estado se obriga a fim de adequar o seu comportamento aos compromissos internacionais assumidos. Esse acordo deve ser submetido à apreciação da CIDH, que pode homologá-lo, caso em que publica um relatório da solução amistosa contendo o resumo dos fatos, a transcrição do acordo e a análise da CIDH. Se restarem obrigações pendentes de cumprimento pelo Estado, a CIDH pode continuar o acompanhamento do acordo até que esteja plenamente cumprido.Ao contrário de uma decisão da Corte IDH ou mesmo de uma recomendação da CIDH que atribuem ao Estado medidas reparatórias de modo heterocompositivo, as soluções amistosas da CIDH caracterizam-se pelo consentimento e pela participação direta do Estado na construção das medidas, tratando-se, pois, de um procedimento autocompositivo. As medidas reparatórias pactuadas podem incluir, por exemplo, a derrogação de leis contrárias aos standards de proteção estabelecidos pela Convenção Americana (1969), o reconhecimento de responsabilidade e aceitação pública dos fatos, a adoção de políticas públicas e reformas legislativas e regulatórias (CIDH, 2018). Cada vez mais essas medidas têm exacerbado a esfera individual e gerado impactos estruturais no Estado envolvido (CIDH, 2018).Nesse contexto, a presente pesquisa investiga se e como as soluções amistosas na CIDH influenciam tribunais nacionais. A pesquisa adota o método de abordagem hipotético-dedutivo, de modo que propõe e testa empiricamente a hipótese de que as soluções amistosas na CIDH podem influenciar tribunais nacionais, mediante fortalecimento e/ou empoderamento institucional. As categorias teórico-operacionais que são articuladas e integram o marco teórico compreendem o fortalecimento de instituições domésticas pelo direito internacional contemporâneo, conforme Slaughter e Burke-White (2006), e o empoderamento de instituições domésticas pelo Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH), com base em Parra-Vera (2019). Slaughter e Burke-White (2006) argumentam que muitos problemas globais não decorrem da ação interestatal, mas sim intraestatal, de modo que suas causas são melhor abordadas diretamente pelos governos domésticos. Por isso, Slaughter e Burke-White (2006) condicionam a efetividade do direito internacional à sua capacidade de fortalecer instituições domésticas, dentre outras funções. Parra-Vera (2019, p. 144, tradução nossa), analisando os impactos do SIDH no cenário latino-americano, desenvolve o conceito de empoderamento institucional para “destacar as maneiras pelas quais os atores estatais redefiniram sua estratégia como resultado das interações com o SIDH e as decisões que resultaram”. Nesse sentido, Parra-Vera (2019) contribui com o debate sobre os desafios da cooperação intraestatal, isto é, entre diferentes ramos, setores e agências estatais. Como procedimentos de coleta de evidências, a pesquisa realiza revisão da literatura, levantamento e análise documental. O acervo documental analisado contempla todos os 129 (cento e vinte e nove) relatórios de soluções amistosas publicados pela CIDH em seu website de janeiro de 2011 a 2023. A esse acervo a pesquisa aplica as técnicas de análise léxica e de conteúdo. Desse modo, busca-se dentre as medidas reparatórias pactuadas aquelas em que foram atribuídas obrigações a tribunais nacionais. Há diferentes formas de fortalecimento e empoderamento institucional, a análise centra-se naquelas que foram convencionadas nas medidas reparatórias e protagonizadas pelos próprios tribunais. A título de exemplo, a capacitação de servidores de tribunais estaduais em direitos humanos é considerada uma forma de fortalecimento, portanto, se a capacitação ficar a cargo do próprio tribunal atenderá ao critério de análise, mas se couber a um ente externo a obrigação de realizar a capacitação não atenderá ao critério, embora não deixe de ser relevante. Isso, porque tem-se a intenção de destacar os tribunais como protagonistas de seu próprio fortalecimento e empoderamento institucional, impulsionados pelo procedimento de solução amistosa da CIDH.Como resultados parciais da pesquisa, verifica-se que, em que pese seja mais comum nos acordos atribuir ao Executivo ou ao Legislativo a implementação das medidas reparatórias, por vezes essa competência é atribuída a órgãos do Poder Judiciário. É o caso, por exemplo, do Acordo de Solução Amistosa 102/19, em que se pactuou que o Estado do Panamá, “através do Tribunal Eleitoral, gerenciará para que se regulamente a criação da categoria de ‘Desaparecidos’ para as vítimas da ditadura militar (1968-1989)” especificadas “a fim de que seu óbito seja registrado e a causa da morte seja por desaparecimento forçado” (CIDH, 2019, p. 8, tradução nossa). Ademais, no Acordo de Solução Amistosa 85/20, “o Estado paraguaio compromete-se, através da Corte Suprema de Justiça, a solicitar semestralmente relatórios sobre o estado processual dos casos de todos os tribunais do país, a fim de verificar o estrito cumprimento dos prazos e termos estabelecidos nas leis processuais” (CIDH, 2020, p. 3, tradução nossa). Essas e outras medidas reparatórias serão analisadas ao longo do estudo. REFERÊNCIAS:CIDH. Informe no. 102/19. Caso 13.017 A. Informe de solución amistosa. Familiares de víctimas de la dictadura militar, octubre de 1968 a diciembre de 1989. Panamá. CIDH, 2019. Disponível em: https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/2019/PNSA13017AES.pdf. Acesso em: 28 maio 2024.CIDH. Informe no. 85/20. Caso 12.374. Informe de solución amistosa. Jorge Enrique Patiño Palácios. Paraguay, 2018. Disponível em: https://www.oas.org/es/cidh/decisiones/2020/pysa12374es.pdf. Acesso em: 28 maio 2021.CIDH. Informe sobre el impacto del mecanismo de solución. 2. ed. OEA, 2018. Disponível em: https://www.oas.org/es/cidh/informes/pdfs/ImpactoSolucionesAmistosas-2018.pdf. Acesso em: 13 jul. 2021.PARRA-VERA, Oscar. Institutional Empowerment and Progressive Policy Reforms: The Impact of the Inter-American Human Rights System on Intra-State Conflicts. In: ENGSTROM, Par. The Inter-American Human Rights System: Impact Beyond Compliance, p. 143-166, 2019.SLAUGHTER, Anne-Marie; BURKE-WHITE, William. The future of international law is domestic (or, the European way of law). Harv. Int'l LJ, v. 47, p. 327, 2006. 

Palavras-chave

Soluções amistosas; Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Fortalecimento; Tribunais domésticos.
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